terça-feira, 11 de novembro de 2014

Adélia Prado, mãe, avó e poetisa. Que mulher!

Adélia Prado, quase 80 anos, poetisa brasileira, essa senhora de cabelos brancos, de fé católica, encanta por sua mente lúcida, clareza de idéias. Professora, formada em filosofa, já escreveu mais de 20 livros, seu último "Miserere", publicado pela Record-Editora.
Lendo entrevista dada por ela à Revista Cristianismo Hoje, surpreendi-me e admirei essa mãe e avó, doravante lerei seus livros, reproduzo aqui uma parte, ela aborda assuntos como espiritualidade, internet, vendilhões da fé e os dias de hoje:
CRISTIANISMO HOJE – Você diz que a experiência poética é sempre religiosa. Escrever poesia é um ato de devoção a Deus, ainda que o poema não seja diretamente ligado à religiosidade?
ADÉLIA PRADO – A arte, querendo ou não, é religiosa em sua natureza íntima.
CH- Para você, o que significa servir a Deus? Você considera uma missionária da literatura?
AP- A literatura, não tendo missão – aliás, arte nenhuma tem –, não pode me fazer uma missionária. Servir a Deus, para mim, é aceitar minha precaríssima condição humana “fazendo as obras da fé”. No meu caso, isso inclui não fugir à vocação da poesia. Toda poesia narra e canta a glória de Deus nas criaturas, na obra de suas mãos.
CH- Como o trabalho de Adélia Prado se conecta com a religiosidade?
AP- Diuturnamente, sou convidada ao seu mistério como um boi que o carreiro acorda com o seu aguilhão. É ótimo que ele não nos dê sossego. Ele pede amor e atenção. Imagine o Criador “precisando” da criatura! Que não tenhamos mesmo sossego e acordemos do sono para a luz da consciência.
CH- Desde Bagagem, lançado em 1976, quais são seus livros favoritos no que se refere a essa experiência espiritual de escrever?
AP- Talvez mais condizentes seriam O pelicanoOráculos de maio e Miserere; o romance O homem da mão seca e a novela Quero minha mãe. Mas, desde Bagagem, na poesia e na prosa, o religioso e a questão espiritual se encontram inapelavelmente – não como meta da escrita, mas como constitutivo da minha experiência humana.
CH- Em suas orações, o que você costuma dizer ao Senhor?
AP- A resposta será sempre de ordem muito pessoal. Posso dizer que sempre peço miserere. Sou muito “pidona”.
CH- Este é, aliás, o título de seu último livro pela Record. Miserere traz, em poemas, seus diálogos com Deus. A Bíblia nos considera miseráveis pecadores, carentes da graça do Senhor, e que somente através de Cristo, o Filho de Deus, é possível obter a salvação. Quem é Jesus em sua vida?
AP- Jesus Cristo é o mais espantoso acontecimento que é possível imaginar. Inesgotável mistério e maravilha. Um homem que se apresenta como Deus! Sua encarnação, morte e ressurreição são o sustento, a alegria, razão e o sentido de tudo. O amor na sua plenitude, o homem por excelência. Só a poesia pode chegar um pouquinho mais perto – a poesia e o amor.
CH- Muitos escritores dizem que o advento da internet, com suas múltiplas possibilidades de comunicação instantânea, empobrece a linguagem e os relacionamentos, sobretudo nas novas gerações. Você concorda com isso?
AP- Por enquanto, ainda há um grande deslumbramento com a internet e seus poderes. Acontecem realmente os empobrecimentos e uma brutalização nas relações ao vivo. Conto com o enfado, o cansaço, a esterilidade disso tudo até que a maquininha mágica fique apenas a real serviço do humano, como uma boa máquina de escrever. Até lá, que cuidemos de nós e de nossos jovens para que saibamos apagar televisão, internet, rádio e o que quer que seja quando estiverem postando lixo dentro de nossas cabeças.
CH- O fato de basear grande parte de sua obra na existência e relevância de Deus torna seu trabalho, de alguma forma, questionado nos dias de hoje?
AP- A questão religiosa incomoda sempre porque enfrentá-la leva ao compromisso. Apesar da enorme carência de significação e sentido, é mais fácil descartar o espiritual que abraçar os encargos da fé. Estamos em tempos difíceis e perigosos, vivendo como se não fôssemos morrer – ou como os pagãos, que dizem “comamos e bebamos, porque amanhã morreremos”.
CH- Aqueles que se dizem religiosos também agem assim?
AP- Muitos religiosos hoje, de todas as confissões, parecem mais “funcionários do sagrado” que ministros de Deus, tal a burocracia, a pressa, a ansiedade, o distanciamento que os envolve e os afasta dos fiéis. Perdem-se entre citações bíblicas, números de telefone e boletos bancários que lhes garantam prosperidade e sucesso. Camisetas, CDs, DVDs, água engarrafada do Jordão, amuletos mágicos, a paz que obterá se ligar tal número.
CH- Como pudemos chegar a esse ponto?
AP- Os vendilhões perderam a compostura; estão dentro do templo com a bíblia ideológica a seu favor. Chegamos a isso porque não vemos mais o Cordeiro degolado sobre a mesa, o sangue sobre as toalhas. Em seu tempo, Jesus já avisava: “O Pai busca adoradores em espírito e em verdade”, numa igreja interior, no coração de cada homem, que cumprirá toda a lei e os profetas se amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Mas, ao que parece, temos horror à simplicidade.
CH- E o que perdemos com isso?
AP- Perdemos os valores da humanização, que incluem desde os espirituais até os mais banais e necessários, como “com licença”, “muito obrigado”, “desculpe”, “por favor”. Morremos da pressa e da gula de aproveitar, aproveitar, levar vantagem em tudo. Precisamos voltar ao Evangelho com real atenção para seu ensinamento, onde o amor é princípio, meio e fim; no qual a paixão de Cristo deve ser vivida como a morte do egoísmo, a maior barreira para a paz, seja familiar ou entre os povos.
Cristianismo Hoje- leia entrevista completa
"Miserere" significa "Tende piedade de nós"

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